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2012-10-23

PARA QUE A MEMÓRIA NÃO SE APAGUE

No dia 11 de outubro de 2012, completaram-se os 50 anos da abertura do Concílio Vaticano II. Foi iniciativa de um Papa já idoso, de quem só se podia esperar um breve pontificado, o tempo necessário para a escolha de um Papa mais novo e, decerto, mais capaz. O seu pontificado foi realmente curto. Não obstante, este Papa, João XXIII, deixaria uma marca indelével na história da Igreja.

Foi no dia 25 de janeiro de 1959, último dia da Semana de Orações pela Unidade dos Cristãos. João XXIII, eleito havia três meses, convidou 18 cardeais para acompanhá-lo a uma cerimónia na basílica de São Paulo Fora dos Muros, subúrbio de Roma. Sem estarem avisados, os cardeais, seus colaboradores, ficaram atónitos e de boca aberta, quando o velho Papa anunciou que pretendia convocar um concílio ecuménico e lhes pedia os seus conselhos. Sem os consultar, grande tarefa lhes confiava. Mas não era só isso. Em todos os tempos, a Cúria, formada por cardeais e bispos e outras pessoas que colaboram com o Papa no governo da Igreja, foi sempre contrária aos concílios ecuménicos. É que esses concílios trazem mudanças e reformas e a Cúria crê que está tudo bem e em ordem na Igreja. Os concílios ecuménicos reúnem bispos de todo o mundo e estes trazem ao Papa os problemas reais da Igreja e aconselham o que é necessário ou urgente fazer; e isso é uma ofensa para a Cúria que se sente sabedora de tudo e participante da própria infalibilidade do Papa.

Por isso, o anúncio inesperado de um novo concílio foi uma bomba indesejável. Mas a Cúria não se deu por vencida. Ela tinha maneira de o anular. Bastaria fazer com que o concílio decorresse da forma que a Cúria dissesse. E, em 11 de outubro de 1962, data da abertura do Vaticano II, ela apresentava, além das suas propostas, nada menos que 70 projetos para serem discutidos e aprovados pelos conciliares. Um trabalho ingente. Mas tratava-se de documentos inofensivos que não mudariam absolutamente nada. Por isso, desde o primeiro dia, os bispos vindos de todo o mundo, puseram de parte todo esse trabalho e chamaram a si o controlo do concílio. O concílio ficava nas mãos dos bispos conciliares e não nas mãos da Cúria.

Na altura, João XXIII anunciou que o concílio não se reunia para fazer novas condenações de heresias como acontecia no passado. Estava reunido para apresentar ao mundo outra imagem da Igreja, torná-la compreensível aos contemporâneos. Não se tratava de aumentar o número de dogmas, mas de falar ao mundo moderno numa linguagem atual e compreensível.

E foi o que fez o Vaticano II. Nos documentos que produziu fez-se entender dos homens e mulheres do nosso tempo, falando-lhes dos problemas e angústias que hoje afligem o mundo. Mas, não querendo provocar rupturas, a sua visão cedeu ainda por vezes a visões que já eram do passado e não se adequavam ao presente. E talvez não tenha adivinhado as mudanças que já nessa época estavam por romper e que afetariam profundamente a própria Igreja. De qualquer modo, o Vaticano II foi, para muitos, um novo Pentecostes.

Em 1968, as manifestações e protestos dos estudantes do mundo ocidental mais desenvolvido foram muito mais que meras manifestações. Foram o começo de uma revolução cultural que trouxe consigo um novo sistema de valores e uma nova interpretação da vida humana. Ela atingiria todos os dogmas e toda a moral tradicional, assim como as instituições da Igreja e de toda a sociedade. Pôs em questão todas as instituições e todos os sistemas de autoridade. Significou a luta contra todos os sistemas de pensamento que tinham a pretensão de ser a verdade.

Contemporaneamente dava-se a revolução feminista e a libertação da mulher. Surgiu a sociedade do consumo e o capitalismo descontrolado. E tudo isso teve profundos reflexos na Igreja.

A Igreja católica era o modelo típico de um sistema institucional radicalmente autoritário e foi imediatamente atacada e denunciada. Com isso sofreram os seus dogmas, o seu código moral e todo o seu sistema doutrinal. Com a descoberta da pílula, a mulher pôde racionalizar e limitar a fecundação; e quando Paulo VI, com a Humanae Vitae, condenou o uso da pílula anticoncepcional, muitas católicas optaram pela desobediência e outras por deixar a Igreja. Com o capitalismo selvagem a doutrina social da Igreja perdeu todo o seu significado e, na prática, nada foi aplicado em casos concretos. O efeito mais visível foi a crise sacerdotal. Cerca de 150.000 padres deixaram o ministério e os seminários ficaram quase vazios.

Lamentavelmente, os Papas e a grande multidão de conservadores de que se cercavam, quiseram fazer crer que todos esses problemas provinham do concílio Vaticano II. Não souberam interpretar os sinais dos tempos: a revolução que estava a acontecer no mundo. E João Paulo II, em 1985, convocou um sínodo extraordinário para apresentar uma interpretação correta do concílio. Mas essa interpretação consistiu em suprimir tudo o que de novo o Vaticano II tinha trazido. Ficava tudo como dantes, como a Cúria pretendia. Desde então, fazem-se muitas referências a esse concílio, mas a sua mensagem continua ignorada.

 

Texto enviado por Luís Guerreiro

 

 



Comentários


2012-10-27

ANTÓNIO GAUDÊNCIO - Lisboa

Com uma certa regularidade chegam a esta rubrica, colocados pelo L. Guerreiro ou pela esposa, textos, de uma tal riqueza e actualidade, que é difícil ficar-lhe indiferente.

 Os últimos temas são todos interessantes e actuais mas a mim o que mais me prendeu foi a evocação dos 50 anos do Vaticano II. Com esse Concílio vi surgir uma esperança de ver uma Igreja que deixaria de olhar para nós como se fôssemos uns objectos que existiam porque ela existia.

Claro que ao falar de Igreja estou a generalizar porque , na verdade, os culpados têm nome .

Na minha vida conheci vários Papas sobre os quais podia dar a minha visão sobre o contributo deles para o bom funcionamento da Igreja mas julgo que nada disso interessa para aqui . Mas sempre disse , e reafirmo-o, que esse grande Papa e grande santo que foi João Paulo II,  fez regredir a Igreja a tal ponto que levou um Cardeal, recentemente falecido, a dizer que ela estava atrasada 2 ( dois ) séculos em relação à sociedade.  Aquela alvorada que o Vaticano II parecia anunciar, começou a desvanecer-se com Paulo VI mas o Papa polaco enterrou todas as esperanças. Claro que não foi só ele. Aquela rapaziada que se passeia por Roma com umas fatiotas ridículas, que imitam muito bem os palhaços ricos, deu, e continua a dar, uma grande ajuda para levar a Igreja ao poço onde se encontra actualmente.

O pobre Cristo, se viesse cá baixo, desmaiava de vergonha ao ver a forma como os seus supostos representantes se comportam e o rumo que deram à sua mensagem.

Aqui chegado, a minha vontade era continuar mas paro e fico aguardando novas pérolas do casal Guerreiro para quem remeto um cumprimento muito amigo  

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