pontos de vista

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2011-07-09

Maria José Nogueira Pinto

(Último artigo de Maria José Nogueira Pinto publicado no DN. Saiu depois dela ter morrido)

Acho que descobri a política - como amor da cidade e do seu bem - em casa.

Nasci numa família com convicções políticas, com sentido do amor e do serviço de Deus e da Pátria. O meu Avô, Eduardo Pinto da Cunha, adolescente, foi combatente monárquico e depois emigrado, com a família, por causa disso. O meu Pai, Luís, era um patriota que adorava a África portuguesa e aí passava as férias a visitar os filiados do LAG. A minha Mãe, Maria José, lia-nos a mim e às minhas irmãs a Mensagem de Pessoa, quando eu tinha sete anos. A minha Tia e madrinha, a Tia Mimi, quando a guerra de África começou, ofereceu-se para acompanhar pelos sítios mais recônditos de Angola, em teco-tecos, os jornalistas estrangeiros. Aprendi, desde cedo, o dever de não ignorar o que via, ouvia e lia.

Aos dezassete anos, no primeiro ano da Faculdade, furei uma greve associativa. Fi-lo mais por rebeldia contra uma ordem imposta arbitrariamente (mesmo que alternativa) que por qualquer outra coisa. Foi por isso que conheci o Jaime e mudámos as nossas vidas, ficando sempre juntos. Fizemos desde então uma família, com os nossos filhos - o Eduardo, a Catarina, a Teresinha - e com os filhos deles. Há quase quarenta anos.Procurei, procurámos, sempre viver de acordo com os princípios que tinham a ver com valores ditos tradicionais - Deus e a Pátria -, mas também com a justiça e com a solidariedade em que sempre acreditei e acredito. Tenho tentado deles dar testemunho na vida política e no serviço público. Sem transigências, sem abdicações, sem meter no bolso ideias e convicções.Convicções que partem de uma fé profunda no amor de Cristo, que sempre nos diz - como repetiu João Paulo II - "não tenhais medo". Graças a Deus nunca tive medo. Nem das fugas, nem dos exílios, nem da perseguição, nem da incerteza. Nem da vida, nem na morte. Suportei as rodas baixas da fortuna, partilhei a humilhação da diáspora dos portugueses de África, conheci o exílio no Brasil e em Espanha. Aprendi a levar a pátria na sola dos sapatos.Como no salmo, o Senhor foi sempre o meu pastor e por isso nada me faltou -mesmo quando faltava tudo.

Regressada a Portugal, concluí o meu curso e iniciei uma actividade profissional em que procurei sempre servir o Estado e a comunidade com lealdade e com coerência. Gostei de trabalhar no serviço público, quer em funções de aconselhamento ou assessoria quer como responsável de grandes organizações. Procurei fazer o melhor pelas instituições e pelos que nelas trabalhavam, cuidando dos que por elas eram assistidos. Nunca critérios do sectarismo político moveram ou influenciaram os meus juízos na escolha de colaboradores ou na sua avaliação. Combatendo ideias e políticas que considerei erradas ou nocivas para o bem comum, sempre respeitei, como pessoas, os seus defensores por convicção, os meus adversários.A política activa, partidária, também foi importante para mim. Vivi-a com racionalidade, mas também com emoção e até com paixão. Tentei subordiná-la a valores e crenças superiores. E seguir regras éticas também nos meios. Fui deputada, líder parlamentar e vereadora por Lisboa pelo CDS-PP, e depois eleita por duas vezes deputada independente nas listas do PSD.Também aqui servi o melhor que soube e pude. Bati-me por causas cívicas, umas vitoriosas, outras derrotadas, desde a defesa da unidade do país contra regionalismos centrífugos, até à defesa da vida e dos mais fracos entre os fracos. Foi em nome deles e das causas em que acredito que, além do combate político directo na representação popular, intervim com regularidade na televisão, rádio, jornais, como aqui no DN.

Nas fraquezas e limites da condição humana, tentei travar esse bom combate de que fala o apóstolo Paulo. E guardei a Fé.

Tem sido bom viver estes tempos felizes e difíceis, porque uma vida boa não é uma boa vida. Estou agora num combate mais pessoal, contra um inimigo subtil, silencioso, traiçoeiro. Neste combate conto com a ciência dos homens e com a graça de Deus, Pai de nós todos, para não ter medo. E também com a família e com os amigos.

Esperando o pior, mas confiando no melhor.

Seja qual for o desfecho, como o Senhor é meu pastor, nada me faltará.

Artigo colocado por Arsénio Pires



Comentários


2011-07-18

Arsénio Pires - Porto

(Outro interessante artigo sobre a Maria José Nogueira Pinto. Porque será que as pessoas com VALORES sólidos e uma vida consequente despertam nos outros admiração... quase reverência? Mesmo aqueles que confessam não acreditar em nada post mortem, quase que ajoelham perante tais pessoas.Os comentários das personalidades portuguesas que aqui temos colocado dizem-nos dessa admiração.

O Mundo comemora os 93 ans de Nelson Mandela. Na prisão foram 27 anos. Um Homem que nunca usou a vingança. Um Homem. O Mundo ajoelha!

Arsénio Pires)

A MORTE DE MARIA JOSÉ NOGUEIRA PINTO

Sabia-a doente; e quando a vi, há dias, na SIC-Notícias, percebi que ela estava muito doente. Mas mantinha a fibra e permanecia guardiã das suas convicções. Gostava muito dela, sem ser seu convivente. Gostava muito do que afirmava sobre ser uma tolice dizer-se que não havia Esquerda e Direita. "Eu sou de Direita. Da Direita dos valores e não da Direita dos interesses." Certa ocasião, na TSF, causticou a Esquerda, nos seguintes termos: "A Esquerda tem, quase de certeza, os melhores escritores portugueses, e não os namora." E citou Redol, Vergílio Ferreira, Carlos de Oliveira, entre outros. Fazia declarações imponderáveis, mas sempre baseadas nas suas fortes convicções ideológicas e éticas. Decidi convidá-la a participar num programa, "Conversas Secretas", que tinha na SIC. Convidou-me a tomar um café, no Parlamento, a fim de acertarmos agulhas. Os deputados olhavam-nos extremamente surpreendidos, ela deu-me o braço e sorria com evidente satisfação. Foi um grande programa, pelo que as suas palavras comportavam. A certa altura perguntou-me: "Olhe cá, porque não me fala na minha cara torta?"

Fiquei completamente encabulado. Ela, então contou que fora operada na Suíça, a um tumor na cabeça, cujas sequelas deixaram o seu rosto um pouco torcido. A revelação, já por si, era impressionante. Mais impressionante, porém, foi quando ela discreteou sobre a solidão no hospital, o sentimento de vazio que assola quem lá está pela força das circunstâncias, sobretudo se se é estrangeiro. Havia, naquela confissão espantosa, uma grandeza e uma dignidade limpas, que convidavam não só à reflexão como iluminavam uma coragem incomum. Sofri um choque com a morte desta mulher, pequena de altura, mas com a estatura moral de elevada estirpe. Vai fazer-nos falta a sua inteligência e o exemplo do seu carácter.

Baptista-Bastos

Jornal de Negócios, 8 Julho 2011

(Colocado por Arsénio Pires)

2011-07-15

Arsénio Pires - Porto

(Texto enviado pela Lígia Pires)

E eis que, mesmo sem gostar muito do Vasco Graça Moura, me surpreendo
com o facto de que poderia assinar por baixo este depoimento. Aliás,
se há coisa que os portugueses sabem fazer muito bem, é elaborar
depoimentos post-mortem, havendo se calhar necessidade de mostrarmos uns
aos outros o quanto nos gostamos, o quanto nos admiramos ainda em
vida.

Eu penso que de nada vale dizer-se que se ama alguém porque, dizendo-o,

não se ama; o amor implica uma acção e é através da acção concreta que
se revela que se ama e que nos sentimos amados. Isto é válido para o
amor entre um homem e uma mulher, entre pais e filhos, entre irmãos,
entre amigos, entre todos e cada um de nós.

O amor, esse amor lato, não estará presente nos depoimentos que se

façam sobre alguém aquando do seu desaparecimento, se não transpareceu
na vivência concreta, se a pessoa que agora parte o não sentiu.

Dito isto, admito, sem qualquer reserva, que esse afecto o sentiu a

Maria José da parte do Vasco Graça Moura na sua vida e, se assim foi,
fica o depoimento muito mais valorizado.



2011-07-14

Arsénio Pires - Porto

(Texto enviado pelo nosso colega Ismael Vigário)

Prova de vida

DN 2011-07-13 VASCO GRAÇA MOURA

"Terminal", dizia-me alguém há cerca de dois meses, "- Ela está em estado terminal". Vi-a chegar com o marido a esse almoço de amigos, em que participou discreta e aparentemente bem disposta, na sóbria gravidade da sua postura algo emaciada, conversando sem aludir à doença, nem à inquietação ou ao sofrimento por que passava. Era assim que aliava estoicismo e bom gosto. Tinha uma maneira directa e inteligente de abordar as questões, encarando as coisas de frente, dizendo o que pensava, apresentando os seus argumentos com total clareza. Era uma mulher sem ambiguidades nem falhas de coragem e todos os que a leram regularmente nesta página podem testemunhá-lo.

A sua vida familiar, a sua carreira profissional, o seu percurso político, as qualidades de que deu provas, a sua energia, a sua capacidade de análise e de decisão, os êxitos do seu trajecto, as suas posições no tocante à sociedade e ao mundo, tudo isso já veio referido em comentários dos mais diversos quadrantes.

A sua autobiografia sumária, num texto concluído e aqui publicado, no DN, no próprio dia da sua morte, é um dos documentos humanos mais belos e pungentes que me tem sido dado ler nos últimos tempos. Pensando bem, creio mesmo nunca ter lido nada assim: alguém escreve na primeira pessoa do singular na iminência da sua própria morte, quase em tempo real, com uma autenticidade, uma serenidade e uma coragem excepcionais e desarmantes!

É com alguma melancolia que me ponho a pensar nessa relação, afinal transparente, entre saber viver e saber morrer. Como quase toda a gente da minha geração em Portugal, eu tive uma educação católica, embora não seja crente desde a adolescência. Não sinto necessidades de nenhuma espécie de incursão na esfera do transcendente, limitando-me a integrar-me nos chamados valores da civilização cristã e a fruir o que deles possa ecoar nas grandes criações do espírito humano, em especial na literatura e nas artes.

Apesar desse laicismo, impressionou-me profundamente a maneira como ela transfigurou a sua educação católica numa experiência pessoal e muito intensa de intimidade com o sagrado e esta em código de conduta moral e norma de actuação prática na vida de todos os dias. Fiquei com a ideia de que a crença cristã foi por ela interiorizada de tal maneira que tornou cada acto da sua vida numa profissão de fé e num exercício de alegria íntima. Isto é muito raro num país em que a tradição religiosa dominante, a católica, se fica as mais das vezes por rituais esvaziados de sentido e pelo mero papaguear do que se aprendeu na catequese.

Ficou-me também a impressão de que a palavra de Deus em que acreditava - e por isso queria, sabia e conseguia vivê-la como alimento espiritual quotidiano - lhe era, ao mesmo tempo, condição e explicitação constantes de uma plena realização pessoal, na própria ascese que procurava para o seu itinerário, na compreensão tolerante do próximo, nos valores da solidariedade e da cidadania, na firmeza com que defendia os princípios que para ela valiam na vida pessoal e na sociedade.

Fazia isso com a enorme naturalidade de ser uma mulher bem do seu tempo, culta e desempoeirada, aberta à modernidade e, sempre que necessário, questionadora da modernidade, de convicções solidamente assentes e pensamento estruturado, de desassombro nas atitudes e coragem sem limites na assunção de responsabilidades, e também com um trajecto de experiências acumuladas de que soube utilizar as mais duras e amargas para a inimitável têmpera da sua personalidade.

Tenho alguma dificuldade em exprimir estas coisas, mas creio que ela soube forjar uma matriz de confiança nessa via anímica e espiritual que, para os eleitos, os happy few, é em si mesma um caminho de esperança e uma proposta de comunhão e partilha, em que o eterno e o temporal se articulam de modo indissociável, seja qual for o lugar de exílio em que o ser humano se sinta a existir.

Por isso, ao dizer "o Senhor é meu pastor, nada me faltará", nas suas palavras finais, ela citou textualmente o mesmo salmo 23 de que já tinha deixado entrever um dos versículos quando disse que, "graças a Deus", nunca tivera medo: "Mesmo que atravesse os vales sombrios, nenhum mal temerei, porque estás comigo."

Esta densa memória que vamos guardar de Maria José Nogueira Pinto é a sua prova de vida.

2011-07-14

Arsénio Pires - Porto

(Texto enviado por Lígia Pires, filha do Arsénio)

Ouvi que a Maria José Nogueira Pinto já há cerca de três meses sabia que não sobreviveria ao cancro; foi justamente esse o tempo que o médico lhe deu e passado pouco mais de 3 meses desse diagnóstico, ela morreu.

Assim, tendo presente essa sentença, ela tratou de dispor da sua vida. Continuou,
com as limitações próprias da doença, a fazer a sua vida política e a manter a vida familiar.

Há uns tempos, uma senhora morreu e deixou duas meninas órfãs. E ela tomou a seu cargo a educação das meninas, estando uma delas neste momento na universidade.

Uma das coisas que ela deixou resolvida antes de partir foi assegurar que as meninas continuariam a estudar, deixando-lhe os meios necessários para esse
efeito. Quando ouvi isto, pensei que ainda há muita gente generosa neste mundo que nós costumamos ver sempre pelo lado pior. Há muita generosidade, sensibilidade e humanidade ocultas, porque algumas pessoas não gostam de fazer alarde do melhor que têm.

Agora, com este texto, constato uma outra grande qualidade desta mulher, qualidade que decerto existe também em muito mais gente do que podemos imaginar - a grande coragem de aceitar o que a vida lhes reserva, com a confiança e a fé de que Deus nos ama e de que, no fim, tomará sempre conta de nós.
E essa consciência faz-me olhar para as pessoas com um pouco mais de humildade e reconhecimento. A bondade não se vê nos rostos e nós continuaremos a ser sempre verdadeiros enigmas uns para os outros.
Mas, porque há gente assim como a Maria José Nogueira Pinto, podemos, com base nos exemplos que vamos testemunhando, dar uns aos outros um pouco mais de crédito, de confiança e de fé no que de bom ainda trazemos dentro de nós.

Lígia Pires

2011-07-11

Alves Diamantino - Terras da Maia

Estimado AS

Tu sabes que eu sei que tu sabes que foi uma grande SENHORA.Integra e de caracter.Até a sua morte foi uma entre as muitas lições que nos legou.

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