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2011-03-21

OS DIAS DO FIM

O que a seguir se transcreve foi escrito dias depois de ter ocorrido o fatídico acontecimento de 25 de Abril de 1974 e ficou calado e esquecido no silêncio da desonra, durante todos estes anos. Remexendo agora em caixotes poeirentos, topei com os vários rascunhos. Porque tais pensamentos mantêm, infelizmente, uma agoniante actualidade, entendi que deveriam sair do seu bolor e gritar à luz do dia. Não pretendo provocar melindres pois são  pontos de vista meus.

 

“…Meu Portugal meu berço de inocente, 

Lisa estrada que andei débil infante,

Variado jardim do adolescente,

Meu laranjal em flor sempre odorante,

Minha tarde de amor, meu dia ardente,

Minha noite de estrelas rutilante,...”

     Tomás Ribeiro - (D. Jaime)

 

 O meu Portugal acabou! A Pátria onde nasci, morreu! Por isso, agora, eu sou um português sem Portugal e um vagabundo sem Pátria.  E o que é a minha Pátria?  A minha Pátria é a terra onde nasci, o lugar onde me criei, a minha aldeia simples, pequenina e pobre, a minha humilde casa, dos meus pais, irmãos, família toda, a capelinha onde ouvia missa aos domingos, a minha serra, os meus campos, o meu rio, a igreja onde me baptizei, a igreja onde casei e onde se baptizaram os meus meninos, o chão sagrado que piso desde os primeiros passos!

         Ah!  Mas o meu País morreu porque o mataram. Liquidaram-no os traidores, os bandidos, os salteadores, os marginais, os estrangeiros, os drogados, os ateus, os impenitentes, os devassos e os libertinos!

           Antes disso, pobre de mim, iludido com o canto da sereia, tinha escrito que o meu Portugal se encontrava doente e moribundo e agora iria convalescer e remoçar. Louca ilusão, cruel engano!  Pela interminável agonia que se seguiu á traição é que eu pude aquilatar, e também todos os do meu sangue e da minha crença, que esta Pátria antiga e que eu julgava eterna, estava com uma estuante vitalidade. Os novos Neros e perseguidores da Fé, os novos discípulos de Satanás, destruíram este “variado jardim”  com requintes de ignomínia e malvadez  pois, antes disso, deliraram com a sua desventura, riram com o estertor da sua agonia, conspurcaram-lhe a face com fétidos escarros.

              Em trinta e poucos anos arrasaram literalmente esta Nação com uma gloriosa história de mil e fizeram dela uma fantochada de clubes de futebol, partidos, bandos de vigaristas, oportunistas madraços  e gabirus politiqueiros, iludindo o seu miserável povo com o engodo da liberdade e da fartura.

                  Liberdade? Mas qual liberdade?  Estranha liberdade esta quando os fariseus que a apregoam só o fazem após terem destruído um povo e uma nação. Nunca a hipocrisia se disfarçou tanto com roupagens enganadoras. Porém, a mim não enganou ela!

                 A palavra liberdade, na boca de tais galdérios soa tão mal, tão desencontrada, tão despudorada, que se aproxima quase da blasfémia e, por isso, quando os ouço falar, logo desconfio. Será liberdade ver uma Pátria destruída, envilecida, traída, humilhada e escarnecida?  Será liberdade viver num País que agora nem pão tem para matar a fome?  Será liberdade sentir os velhos escarnecidos e deitados ao lixo? Será liberdade ver a juventude prostituída? Será liberdade ter de trancar portas e janelas ou sair à rua cheio de medo, sujeito a ser assaltado, agredido, roubado, morto? Será liberdade ver os gatunos, os assassinos, os incendiários, os corruptos, os malfeitores, os prepotentes serem louvados e premiados pelos seus crimes por uma Justiça de impudica caricatura? Será liberdade ser sugado e esmagado por pesados impostos que se destinam apenas a engordar mandriões e finórios, como nunca aconteceu mais desde os tempos da dominação dos Filipes estrangeiros? Será liberdade não poder amar com a descontracção da felicidade e alimentar o ódio, terrível e vesgo, santo e justo, mas ódio?  

                 Como eu desconfio!  A liberdade para  essa pérfida e traiçoeira pandilha  é poder roubar impunemente, matar sem castigo, blasfemar sem anátema, trair sem remorso, amedrontar sem escrúpulo.

               Como eu sorrio de mofa quando ouço os cães da política a falar de liberdade, de progresso, de fartura, de bem estar. Os perros politiqueiros a falar em amor; vejam lá!  É o mesmo que ouvir o diabo a dizer que Deus é bom!  Os mabecos dos partidos a falar de bem-estar  e de paz quando, onde eles imperam, só existe ódio, trevas, mentira, perseguição, tirania, miséria e fome. Porque eles só destroem e nada constroem, só roubam e nada oferecem, só se sentem bem nas ruínas das consciências e no negrume da mentira como as larvas nocturnas.  E todos sabem que as trevas são a marca do inferno.  As abantesmas da política não conseguem viver na luz e claridade porque são filhos das trevas e do Orco. Liberdade na boca dos cerdos tiranos?  Deixai-me rir!  Eles não servem os cidadãos, servem-se a eles próprios!

               Proclamam aos sete ventos que o  “... povo unido jamais será vencido”, mas não é verdade porque o povo não só foi vencido, como foi destroçado, dilacerado e eliminado sem piedade.

          Nós já não somos “heróis do mar”, nem da terra sequer, nem de nada.  Nós poderemos ser a ironia do mar porque abandonamos o mar e a chacota dos outros povos porque perdemos o respeito de nós próprios. Pois que povo é este que premeia e adula  todos aqueles que o traíram e roubaram? Que levou em triunfo arrenegados como os Soares, os Cunhais, os ditos “Capitães”, “cœterosque omnes diabolos” e todos os restantes energúmenos e parasitas que lhe chucham até a alma?  Revejo agora que, em toda a história da humanidade, quer nas grandes civilizações, quer nas tribos do sertão, não existe memória de rendição de qualquer exército semelhante á protagonizada pelo exército do meu País que entregou as armas a meia dúzia de maltrapilhos  por inane capitulação, sem dignidade e sem honra.  Que povo é este?

 Mas eu tenho fé que essa gentalha há-de ter o seu castigo; tem de ser punida com justiça, deverá pagar pelos seus crimes, é mesmo forçoso que seja castigada, pois só quando isso acontecer poderá haver paz nos túmulos de todas as gerações de heróis que existiram nestes mil anos de História, só dessa forma a nódoa da traição e da infâmia  poderá ser limpa de todas as fardas de um exército que até já nem existe!

            Temos de varrer este Portugal, esta martirizada terra de Santa Maria  da corja política que o tomou de assalto e da escória que a compõe. Temos de limpar esse esterco e queimá-lo, temos de alindar de novo esta Pátria amada, temos que exterminar a bicharada rastejante, todos os escaravelhos vorazes que destroem os nossos legítimos e ancestrais valores. O tempo chegou!

                Um grande pranto foi ouvido em Rama: era Raquel chorando os seus filhos. Por isso eu choro por ti, Pátria minha! Choro porque tu choras, porque sangras, porque sofres. Choro porque a tua tragédia não tem fim!  Só neste momento, nesta hora negra da desgraça e da morte é que eu pressinto o quanto a minha moribunda Pátria foi grande!

                 Este  “... jardim à beira mar plantado” sobrevive ainda, apenas e só, através da alma que é a sua língua imortal, o seu idioma eterno; o resto decididamente já morreu todo. O que me dói e transtorna é que o meu País tenha perecido pelas mãos de uma escumalha de traidores, pelas costas!

                Sinto que estou a escrever numa língua que é o que resta duma Pátria que morreu e é já uma Saudade!

 

“...Meu vergado pomar de um rico Outono

Sê meu berço final no último sono!”

          Tomás Ribeiro (D.Jaime)

 

    Ao menos isso...peço eu!

 

(Postado pelo autor, A. Martins Ribeiro)



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