pontos de vista

Espaço destinado a temas diversos....


2010-06-27

DESDE AS CASAS CHEIAS AOS TEMPLOS VAZIOS

 

Colegas e amigos:

O Alexandre afirmou recentemente no “Fale connosco” que “A Igreja, que parece ser a nossa corporação, não nos merece nenhum reparo.”

Penso que a ideia emitida pelo Alex não corresponde à verdade. Quem tem seguido os diversos artigos que aqui, no “Pontos de Vista”, temos colocado, pode afirmar que temos, ao dispor de todos, excelentes “pontos de vista” que visam não “dizer mal por dizer mal” (disso estamos todos cheios!) mas sim atacar problemas profundos da Igreja e deixar caminhos e perspectivas abertos para reflexão e mudança.

Por aqui tem passado muito do bom que em “teologia sem fronteiras” se tem produzido a nível internacional.

Dizer mal é próprio de conversa de soalheiro.Reflectir e apontar caminhos de melhoramento é propriedade de quem ama.Mas, sabemos, muito poucos amam a Igreja. E também por aqui passa a nossa tolerância.

Agora… tolere-se também as ideias e argumentos de quem defende os seus valores, ainda que sejam “estatísticos” ou de “matemáticos de bancada, sociólogos diagonais e julgamentos sumários”. 

As nossas intervenções não visam pessoas mas ideias. Em nada ficamos diminuídos por outros não partilharem das nossas ideias e/ou valores.

Às ideias podemos lançar pedras. Às pessoas devemos sempre abrir a porta e os braços.

Arsénio


P.S. Espero que este artigo, que traduzi do espanhol, sirva para confirmar o que acima disse.


DESDE AS CASAS CHEIAS AOS TEMPLOS VAZIOS

É sabido que na Igreja primitiva não havia templos. Os cristãos reuniam-se nas casas, uma vez que a casa era a estrutura base do cristianismo primitivo. Ou seja, a Igreja era a instituição que aglutinava as “igrejas domésticas” (R. Aguirre).

Esta situação durou até ao séc. IV quando, a partir de Constantino, se construíram os primeiros templos cristãos. Foi o Concílio de Laodiceia ( 363-370 d. C) que proibiu a celebração das eucaristias domésticas. Até então, ou seja, durante três séculos, a Igreja não teve templos, não estava em determinados edifícios ou locais concretos; o sagrado eram “as pessoas”.

Vale a pena explicarmos isto e tirarmos as devidas consequências.

Pelo que nos contam os evangelhos, Jesus não levantou nenhum templo ou capela. Nem organizou nenhum centro de espiritualidade ou uma casa de retiros. Jesus foi um laico que viveu laicamente como um profeta itinerante. Uns profetas que, como sabemos, tiveram sérios conflitos com o Templo de Jerusalém e com os seus sacerdotes. Até que tudo acabou tragicamente na paixão e morte na cruz. Depois da Ressurreição e do Pentecostes, o livro dos Actos diz-nos que, quando mataram o primeiro mártir, Estêvão, ele, precisamente quando o iam matar, disse que “o Altíssimo não habita em edifícios construídos pelos homens” (Actos 7, 48). E, o que é mais importante, S. Paulo afirma com toda a clareza que a morada própria de Deus não é construída por mãos de homens (2 Cor 5, 1). E a Carta aos Hebreus diz de forma explícita que o templo “não construído por mãos de homens” se instaurou a partir de Cristo (Heb 9, 11).

Os primeiros cristãos tinham razões muito sérias para dizer estas coisas. Aqueles cristãos não queriam templos e o motivo desta recusa não era económico (o não ter dinheiro para tais edifícios) nem político (o terem que se esconder em tempos de perseguições). O motivo por que recusavam os templos era teológico pois que uma das convicções mais fortes da Igreja daqueles primeiros séculos era que o templo dos cristãos é a comunidade (1 Cor 3, 16-17; Ef 2, 21) ou cada cristão em particular (1 Cor 6, 19; 2 Cor 6, 16). O que quer dizer, logicamente, que para os cristãos, os de então e os de agora, não há outro templo que não seja a comunidade mesma ou cada ser humano em concreto.

Ou seja, o lugar do encontro com Deus não é um espaço material (geográfico) mas o espaço humano do encontro entre as pessoas. No lugar onde os humanos se encontram, se comunicam, se unem e convivem, aí é onde se encontra Deus.

Esta maneira de pensar tão revolucionária durou algum tempo, mas não muito. Somente aguentou três séculos. A partir do momento em que a Igreja se viu com poder, expressou esse poder, entre outras coisas, nos edifícios levantando igrejas, templos, basílicas e capelas. Com isto conseguiu várias coisas:

1.    Encerrar Deus no templo, que podia ser grandioso, sinal de que quem estava ali era o Todo-poderoso, mas já não era o Deus humanizado que se encontra entre os humanos e humanizando-se. Uma consequência que veio a ser perigosíssima  porque assim nós, os cristãos, descarregamos as nossas consciências entrando num templo enquanto que na rua, em casa, no trabalho… nos portamos como se Deus não existisse. O respeito guarda-se no templo, e assim se tornam mais toleráveis as frequentes faltas de respeito que cometemos na convivência em  todas as outras horas e em todos os outros lugares. Espantamo-nos com a profanação dum templo qualquer mas não nos impressionam as constantes profanações de toda a classe de pessoas que nós próprios cometemos, ficando, inclusive, com a consciência tranquila de quem faz “o que tem que fazer”.

2.    É mais fácil construir um templo do que construir uma comunidade. Maneja-se melhor um tijolo do que a convivência. Desta maneira nos encontramos agora com muitos templos e tão poucas comunidades. Mostramos monumentos mas não podemos mostrar grupos humanos que se amam e onde não há segredos a esconder.

3.    Os templos costumam dar um bom rendimento económico. É coisa que todos sabemos desde que se começou a levantar templos. Um dos favores que Constantino fez à Igreja foi a concessão de poder receber heranças e legados (cfr. Código de Teodósio (CTh. 16. 2. 4 = CJ 1.2.1, do 321). Desta maneira se abriu a porta para o enriquecimento da Igreja através das enormes doações de pessoas ricas que deixavam os seus bens para os templos e assim se morria em paz, tal como o explica o recente e magnífico estudo do Prof. Ennio Cortese sobre as grandes linhas da História Jurídica Medieval (Roma, 2008).

Um dos muitos problemas que a Igreja tem que enfrentar é este:

Cremos no Deus que encerrámos nos templos ou cremos no Deus que está em cada ser humano? 

Eis aqui dois modelos de Igreja que desencadeiam duas formas de entender o cristianismo e a fé em Jesus, o Senhor. 

José Mª Castillo



Comentários


2010-07-03

Arsénio Pires - Porto

O comentário do Alex tem toda a razão de ser. Vem na linha do que aqui temos escrito, sobretudo através das opiniões dos vários autores que nos Pontos de Vista têm intervindo. (Por exemplo, o teólogo autor do presente “ponto de vista”.)

Comungo destas ideias. A Igreja católica, onde milito, está anquilosada, num estádio pré-Concílio Vaticano II, com uma estrutura absolutista, nada democrática no sentido de que o seu povo continua a ser “leigo” na matéria. Em quase todas as matérias.
Mas quando digo “Igreja católica” refiro-me à sua estrutura hierárquica e não aos milhões de católicos que, anonimamente, sempre foram o verdadeiro motor deste movimento (mais que religião!) que tem feito (também!) andar o mundo.

A Igreja católica não pode embarcar em tudo o que é moda. É certo. Mas também não pode fugir do mundo em que estamos, um mundo que se deseja participativo e de valores humanos sem preconceitos. Na Igreja católica o “povo” não tem voz activa para nada. A mulher continua a ser discriminada no acesso a todos o sacramentos e os bispos continuam nos seus palácios como se de senhores feudais ainda se tratasse.

Mas, uma coisa é a Igreja na sua estrutura hierárquica anquilosada e obsoleta e outra, bem diferente mas de que não se fala, são os seus militantes que nos vários continentes e sempre junto dos mais pobres e desfavorecidos gastam os seus dias e vidas.

E ainda bem que não se fala deles. É sinal de que estão a seguir o mandamento de Jesus: Não vêm tocar a “vuvuzela” para a praça.

2010-07-03

Alexandre Gonçalves - Palmela

Não vou exprimir nenhum ponto de vista. Quero apenas esclarecer que tudo o que nos diz respeito suscita o meu interesse. E todos os debates e ideias que por aqui se desenvolvem são dignos do meu apreço. E tanto quanto mo permitem o meu tempo e a frágil tecnologia que o serve eu procuro ler, interpretar e até intervir. Na afirmação que  o Arsénio me cita eu apenas queria referir que se pressente em muitas das nossas opiniões um certo acriticismo, aceitando de mão beijada muitas ideias feitas e velhas, especialmente nos assuntos que se prendem com a Igreja, quer seja a de Roma, quer seja a portuguesa. Cito o exemplo do actual papa e da corte de anciãos que o rodeiam, movendo-se pelo mundo em estilo imperial, com uma pompa escandalosa, com uma mensagem que não deixa eco nos corações. O que se ouve ou lê a seguir é um coro de comentadores elogiosos, exaltando o talento e a inteligência de Sua Santidade, esquecendo o sofrimento e a pobreza dos povos, jamais denunciando os autores destes desequilíbrios humanitários. No domínio interno, a Igreja deixa-se morrer nos templos, nas medievais liturgias, na prática dos que se dizem crentes militantes. Como é que Deus se safa num Cristo sempre crucificado, a presidir aos actos de culto, com  santos  laterais ora a fugir da terra ora com um rosto destroçado de angústia? Para onde foram a juventude e a esperança e os Cânticos do Vaticano Segundo? Quem matou essa festa e esse Deus renascido?

   Criticar nem sempre é demolir. Mas ás vezes é indispensável. Se foi a Igreja que nos deu um dia a mão, é justo que agradeçamos. Mas também é imperioso que nos desprendamos de tantos dogmas e de tantos hábitos corporativos claramente datados e actualmente perniciosos, confusos e contraditórios. Tudo isto me faz lembrar o ataque dos  Turcos a Constantinopla: uns tomam a cidade, outros exibem inteligências angélicas a analisar a sexualidade dos entes celestiais.

  Em relação aos matemáticos de bancada e expressões afins direi que a morte de uma só  pessoa desmonta quaisquer argumentos. O drama dos homens é encontrar um caminho, uma luz, que torne o planeta habitável. E jamais se fará essa procura sem alguns acertos e demasiados erros.  

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