2013-10-11
Ismael Malhadas Vigário - Braga
(Fonte de inspiração: Entrevista do Sr. Primeiro Ministro de Portugal em 9/10/2013)
Vieram de todos os pontos da pólis e juntaram-se à sua volta para o interrogar sobre o futuro,
o futuro, que o presente é um rio que corre seco nas suas enormes vidas.
Houve um tempo em que a água derrubou pontes, diques e margens. E da abundância do caudal transbordou lama, e pedras e revolta e desespero.
Um enorme vendaval e, onde antes eram estradas, nasceram agora becos lamacentos.
Agora o rio vai seco, um fio de água no fundo do vale.
As colinas apertaram o rio e, ele, como um fio, desafia a caminho do mar, com enorme desejo de o alcançar:
Chego?!... Não Chego?!...
E os homens apolíneos esperam que a água do rio cresça, a torrente se forme, que ela possa de novo correr até ao mar.
O desespero acorreu à margem do rio, alguns precipitaram-se para se refrescar e a água era escassa.
Os primeiros a chegar ainda e molharam os lábios secos de tão longa caminhada, num fio que ainda corria surripiado das “lájes” húmidas d’outras enxurradas.
Outros, os segundos, que vieram a seguir, olharam para o rio,
era uma imagem, uma memória d’outros tempos.
Os primeiros voltaram-se para os outros, entreolharam-se e não se falaram!...
Dai-nos da vossa água? –pediram os últimos. Os primeiros de olhos cabisbaixos responderam: - Não, não chega para nós.
E todos quiseram subir a colina, com um fôlego, que foram perdendo.
Estavam exaustos, veio-lhes um cansaço, um suor misturado em lágrimas que formava uma outra água que não dava para os saciar. Sabia a sal e a fel e ninguém a podia beber.
Os outros, os últimos a chegar ao rio, aqueles que olharam a memória do rio, não puderam humedecer os lábios, já tão mirrados e sequiosos de tanto caminhar.
Os dois grupos de homens separaram-se e nunca mais se reencontraram. Cada um seguiu o seu caminho: lugares que não levam a parte alguma. Soube-se depois que alguns foram dar à terra de ninguém. Nesse lugar não havia leis, nem mandantes de ordens, porque não havia ninguém para dar ordens. E chamaram a este novo lugar, o paraíso, a terra perfeita onde não havia a necessidade da necessidade, a loucura da loucura, uma terra fora da terra, um sítio utópico. E, passado algum tempo, alguém disse que estava farto de estar na terra de ninguém, pois tudo ali era um sensabor, um cansaço de perfeição, uma ausência de humanidade, sofrimento, angústia, de algo para disputar.
Alguém disse que estava farto de estar na terra de ninguém, e era melhor regressar à terra de alguém, onde havia alguma coisa para disputar. Sabiam que não era o paraíso, mas havia alguma razão para mandar, fazer, gritar, barafustar, reclamar ao vento, pedir ajuda às andorinhas, mesmo em voo e quando não param.
A terra de alguém nunca pode ser a terra perfeita, os seres que a habitam são incompletos, imperfeitos, egoístas, fazedores e pensadores do mal, mas são homens.
Na terra de ninguém, há apenas lugar para o sonho, a imaginação, o fantástico, o mito, os deuses, além das nuvens e de todos os espaços e palavra inomináveis.
A terra de alguém é mesmo muito imperfeita,
mas é um mundo que ainda pode ser modificado pela ideia imaginativa do construtor.
É verdade que houve um tempo em que o sonho morreu e morreu várias vezes e houve compassos de espera e forte desejo do seu regresso.
Agora chegou o tempo do desespero, onde o sonho morreu, homens que partiram para uma terra incerta, outros prostraram-se à vista da terra seca, árida e onde a brisa se esqueceu de levitar a erva seca e hirsuta que ainda desafia o mau tempo, a desconsolação.
As ervas hirtas e desafiadoras esperam por novos visitantes, alguém que as ampare, as vaporize, as levede e lhe faça companhia de um novo renascimento, uma janela aberta no horizonte.
-“Nós estamos sós” – gritaram todas as ervas secas e ainda hirsutas.
“Queremos a companhia da água, de uma nova voz, de um outro olhar” – pediram todas ansiosas e a tremer ao vento.
Insistiram bramando aos quatro ventos –“Queremos água, uma gota de água” e repetiram todas unidas: “uma gota de água, uma gota… gota .. de água, que a nossa haste está quase a partir, socorro, por favor, já não podemos mais”.