Num lugar de mau caminho
Tão alto que toca o céu
Mora a S. ra do Minho
Essa linda minhota
Uma Santa tão marota
Que usa lenço no lugar do véu
Aquele abraço
Zé Lamas
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HORRESCO REFERENS - I
Denique! Finalmente, o esplendor da ÁGORA, abandonando os morros de Atenas e descendo à planura das instituições, onde todos os acontecimentos se tornam visíveis pela transparência da palavra. Parabéns, Aventino! O método resultou. O tertulianismo tardo-gótico renasce das cinzas, com ou sem reunião marcada. Confesso a minha rendição e ardo incrivelmente para que este praça seja tão ruidosa quanto o necessário para repelir os ataques galopantes da peridosa "demência". Gloriosas saudações a todos os delinquentes!
Meu amor de antigamente! Eu nunca me perdoei aquela escolha. Ainda hoje estremeço quando lembro a véspera daquela páscoa. Altas horas da noite, nas imediações de um olival, na cumplicidade de um luar frio. Clandestinamente, como quem rouba chocolate. Tu depões o teu amor molhado e virgem nas minhas mãos. Tu suplicas. Tu tremes. Eu não resisto, dizes. As tuas lágrimas colaram-se às minhas e juntas deslizaram pelos nossos corpos genuínos. Não vás, Alberto! Pelo teu Deus, em quem não crês. Pelo meu Deus de catequese, que nunca levaria meninas da minha idade para o inferno. Eu, cheio de uma força postiça: tu não entendes. Não queiras entender! Não compliques mais. Eu quero mesmo ser padre.
No domingo, era a grande festa. Para mim, foi sempre uma páscoa triste. A mãe-igreja punha nisso toda a solenidade. Eu sou o ensaiador. O coro são duas ou três vozes masculinas. O resto são as mais belas moças que Deus fez para cantarem nas celebrações. Quem o garante é minha mãe, que ignora em absoluto os meus desejos. E a multidão dos meus pecados. O Sr. João teles e a ti Gracinda, que vigiam a minha vocação, também garantem que nunca houve em Sto Amaro um seminarista tão dotado para a vida religiosa. Durante a missa, consegui fazer passar a imagem de um jovem sereno e seguro. Mas no coro estavam os olhos e a voz da Susana. Dezoito anos blindados, notas brilhantes e entrada no próximo ano em Medicina. Cabelos cuidados descendo com inocência pelos ombros. Um rosto de mármore sem costuras. E uma boca de frutos vermelhos, por onde a encandeante brancura dos dentes mordia sem esforço a pureza do canto. De repente, tudo o que eu dissera na véspera era mentira.
Que faço eu aqui? Que farei eu no outro lado? Quem me pôs neste incêndio? Os olhos dela derramam um rumor de lágrimas. E uma absoluta inocência de quem nunca mordeu as maçãs bíblicas. Eu tinha adaptado um espiritual negro, com letra minha, apelando para a glória e o vigor da se ser jovem. Juntei-me ao grupo dos rapazes para fazermos duas vozes, de belo efeito sonoro. Era o cântico final. Êxito retumbante. O pároco gostou e agradeceu em público. Susana olhou muito e sorriu. E eu gaguejei para dentro de mim. "À noite"..., disse-me ela em segredo.
Depois da ceia, Sto. Amaro é só silêncio. Saio de casa, vou por uma vereda sonâmbula e ao fundo é outra vez o olival. Um pouco de lua torna inverosímil qualquer encontro. Ela viu-me pela janela. Dá a volta. A noite arrefeceu ligeiramente. O abraço é inesquecível. A vida inteira não cura esta ferida. Sempre vais, diz ela. Sim, sempre vou, digo eu. Na camioneta das dez. Encostou o rosto e os longos cabelos ao meu ombro. Chorou até não poder mais. Depois, como quem avisa de que alguma coisa ficou por esclarecer: vais esquecer a quinta da ribeira? Os juncos, os amieiros?E as amoras do verão passado? Eu disse apenas, com alguma secura: podes ajudar-me a ir embora? E quanto a lembranças, veremos quem esquece primeiro! A lua deixou subitamente de nos proteger. Parecia mãe e agora é pura sombra. E a noite caiu como um pesadelo em cima dos nossos corpos destroçados. Dei a volta com ela pelo outro lado da casa. Ruas vazias. Solidões de pedra. Numa esquina da rua direita, disse-lhe em jeito de conclusão: até aos meus vinte cinco, foste tudo o que de bom me aconteceu. Apesar disso, não tenho forças para ficar mas também as não tenho para partir. Eu não sou ninguém. Sou um embrulho bem embalado, para despachar pelo correio. Eu não queria sentir este horror, este frio de partir ficando, este gelo de ficar partindo. E esta angústia de to dizer, como se me quisesse justificar. Não tenho um pingo de fé. Mas se eu der o jeito, serei padre, como outro qualquer. E se for dando o flanco, até me fazem chegar a bispo. A hierarquia eclesiástica não precisa de talento nem de santidade. Não te repugna esse risco?, interpelou-me ela. Sim, repugna, mas eles despojaram-me da consciência, disse eu com raiva. Verteram-me num molde, como se eu fosse de plasticina. Fui cozido no forno em lume brando. Agora antes quebrar do que torcer.( Uns minutos de silêncio insuportável). Os teus dezoito dão passos certos, com rumo bem definido. Vais chegar cedo a qualquer lado. Os meus vinte e cinco não têm para onde ir. Estão sem passado, sem presente e bem perto de sepultarem o futuro entre muros medievais. Disseste que eu era livre. É essa a minha imagem de venda e de hipocrisia. Sim, sou livre. Por fora, como um pregador. Por dentro, como um fardo, a despachar num comboio de mercadorias.
Susana ouviu-me e teve pena de mim. A noite gelou. Esta páscoa é amarga, como veneno. Despedimo-nos num outro abraço, que deixava janelas e portas abertas. No dia seguinte, a camioneta bufava de cansaço. Subi e olhei para trás e para cima. Susana foi a casa de uma tia para me ver partir. Vejo-a agora acenando e fazendo gestos que perduram. Os cabelos inclinados, como lianas, vão-me prender para o resto da minha vida.
SIC TRANSIT… MA NON TROPPO
O Aventino abre a porta
e nós iremos entrar.
Embora andando perdidos,
agora iremos unidos
prontos pra filosofar.
Na nova Escola de Atenas
quem nos livrará da fama?
Só nos resta despertar,
pois são lentos a acordar,
os infiéis da mourama!
Comeremos, beberemos
do que levarmos prá mesa.
Se dum Simpósio se trata
falemos todos à farta
do que não temos certeza.
O tema deve ser dado
antes da nossa reunião.
Só tem direito a opinar
aquele que antes suar
em profunda reflexão.
Desde já marquemos data
Para o nosso ajuntamento.
É que as férias já aí estão
e, quer queiramos ou não,
delas nasce o esquecimento!
SIC TRANSIT GLORIA MUNDI
Meus caros GAUDÊNCIO, ARSÉNIO e CASTRO:
A vossa grandeza e generosidade chega para preencher o UNIVERSO desses encontros que aí virão. Nessa sexta feira anunciada, à hora que for a vossa hora, tereis as portas abertas para o grande banquete da nossa ignorância.
Sim, haverá pão e vinho, cajado e albergue e, chegada que seja a hora da partida, nesse dia ou em qualquer dia dos que sobrevierem,
cantaremos "Tejo que levas as águas/correndo de par em par/lava minh'alma de mágoas/leva minh'alma pro mar. (ADRIANO)
Meus Caros Amigos
Desta vez conseguiram acordar-me deste estado de hibernação que a continuar, poderia configurar uma morte antecipada.
O mérito deve-se indiscutivelmente à tenacidade do Aventino que fugindo ao estilo a que nos tinha habituado (com recurso ao aguilhão), passou a uma nova fase assente no que de melhor ele tem: dar, sem nada pedir em troca.
Ora vejamos se não é assim:
1 - Ali pelo início da Primavera lançou um convite para uma confraternização à mesa com as lampreias.
Como ficou bem claro foi necessário cancelar as incrições pois não havia condições logísticas para albergar tanta gente ao mesmo tempo, aguardando os que não puderam participar, pela próxima campanha lá para a Primavera do ano que vem.
2 - Fomos mais tarde presenteados com o convite do Assis que nos proporcionou horas de verdadeira confraternização e partilha de pão, vinho e pequenos retalhos das nossas vidas. Foi bom.
Também em casa do Assis o espaço foi totalmente ocupado com a resposta que deram os que puderam e quiseram participar. Correndo o risco de estar a exagerar, penso que foi a maior participação de sempre.
3 - E porque foi tão bom, o Aventino numa proposta sem paralelo e provavelmente irrepetível, lançou um convite para um jantar apresentando um catálogo de restaurantes que apesar de não ostentarem nenhuma estrela michelin, a estes nada ficam a dever.
Pois para os que não puderam estar presentes fiquem sabendo que foi um jantar de arromba onde se comeu e bebeu do melhor. É caso para dizer que nunca comi tão bem e tão barato.
Antes de passar ao ponto seguinte quero esclarecer que mesmo assim, o restaurante não encheu.
4 - Sempre com o objectivo de manter acesa a chama, veio agora o Aventino lançar um novo desafio. Este não é melhor nem pior do que os anteriores pois todos eles foram especiais e dignos do nosso agradecimento pois revelam uma vontade férrea de não deixar que o Inverno aconteça antes do Outono.
Desta vez abre as portas do seu jardim algures lá para os lados da Foz na Rua Marechal Saldanha.
Este é um convite verdadeiramente original pois além de estar antecipadamente assente que ninguém comerá ou beberá nesse jardim, nos deixa uma oportunidade para caminhando exercitarmos estes músculos e estes ossos cada vez mais emperrados à procura do mesmo.
Como todos sabemos esses encontros mensais não nos levarão ao paraíso (sendo certo que os há...) mas permitirão que a luz penetre mais fundo nas nossas almas tornando-as mais leves e por essa via ficaremos certamente mais perto desse objectivo.
Os encontros mensais terão o seu início em Setembro e têm dia marcado. O tema é sempre desconhecido assim como os seus participantes.
Aqui permito-me antecipar dificuldades pois o quorum é essencial para que valha a pena.
Aventino. A manter-se o convite deveria quanto a mim ser afinado o método para que antecipadamente se saiba se vale a pena ou não aparecer. Não que não seja um gosto andar pela rua à procura da casa e sê-lo-á ainda maior conseguir encontrá-la e poder dar-te um abraço. Mas um encontro em que não poderemos molhar a palavra, mesmo que seja trimestral ou semestral para os menos aguerridos, exigirá pelo menos uma fonte próxima para que os voaços da água assegurem a necessária lubrificação à garganta.
Por aqui me fico aguardando com expectativa o início dessas sessões de fim de tarde (sendo certo que pela hora agendada ainda estou a trabalhar para a minha reforma...).
Para todos um grande abraço e para ti Aventino os meus parabéns pela tua força que teimas em partilhar connosco. Pelo que me toca, OBRIGADO.
Continuarei a visitar este sítio que é nosso. E TU? E TU? E TODOS VÓS? Ainda estais cá?
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