2010-08-01
Assis - Folgosa - Maia
Ora viva Agosto!
Era um belo mês este, quando partíamos para férias desde a nossa quinta "A Barrosa"... Em 1955 parti eu, na companhia de mais meia dúzia sob a batuta responsável do nosso saudoso Manuel Abrunhosa, em direcção ao Douro, ao lindo Douro que muitos dizem ser uma das paisagens mais belas do mundo. Não fosse ela minha, eu confirmaria sem titubear que será certamente a primeira em beleza... Sim, eram as minhas primeiras férias - grandes e pequenas - passadas com os mais chegados familiares. Apenas 14 dias que me souberam a mel, como o saberiam todas as restantes até rumar a Nava del Rey e Valladolid. No 2ºano, já foram um pouco mais longas: 18 dias; no 3º, 22; no 4º, 25; no 5º, 30; e no 6º, em época de Páscoa, 12 dias para dizermos adeus por mais quatro anos... E já na época fomos considerados uns afortunados, pois grande parte daqueles que nos precederam nem um dia tiveram até à ordenação... Não me quero queixar contra a sorte, pois outros maiores razões teriam para o fazer, como podeis ver. Mas que era uma violência muito grande, lá isso tenho de confessá-lo, embora os superiores, como ainda há dias, no cemitétio de Coimbrões, me confessava o Pe. Ibanhes, eles procurassem amenizar a situação intra muros com variados eventos, nomeadamente as rifas de Natal e os teatros que na época eram levados a cena. Recordo que muitas dessas peças eram até inventadas e escritas pelos próprios. O Pe. Ibanhes, então director, ele um homem tão duro - assim o tínhamos em conta e algumas cenas de que fizemos parte não o desmentem - ele próprio criou pequenos diálogos cómicos que a todos nos faziam rir, ao menos àqueles que éramos mais inocentes...
Como disse, não pretendo queixar-me e menos de quem teria mais razões para o fazer do que eu. Mas, sendo a família, uma das maiores batalhas da Igreja, não compreendo como se pôde chegar a praticar tamanha barbaridade arrancando aos pobres pais crianças de tão tenra idade. - Sei que sem a prática desta tão grande violência, a maioria de nós não teria conseguido estudar. Mas eu pertgunto-me, hoje que sou adulto: "Porquê tudo isto"? - Continuo à procura de uma resposta e ainda a não encontrei, ao menos de forma cabal, ou talvez... - "Pobres, sempre os tereis convosco..." diz o evangelho, o escrito. Não sei se algum dia o terá dito Jesus. Alguns dirão que não há volta a dar...e sentem que com este seu raciocínio tudo fica resolvido. Pois eu penso que tudo continua na mesma ou ainda pior, se continuamos a pensar dessa forma. - Sto. Agostinho, julgou ter tudo explicado com o seu "pecado original", e a Igreja constantiniana também. A Igreja, de origem pobre, trocou o cajado de madeira do profeta Jesus de Nazaré pelo báculo de prata ornamentado com pérolas e diamantes. A sua túnica - única - virou, como diz o brasileiro, em toga com vários metros de cauda. O seu banco de madeira rústica transformou-se em trono e ao trono começaram a chegar os tributos. Aliou-se ao poder. Portanto, quem deverá defender a partir de então? - Àquele que tão grande favor lhe fez: O poder. O pobre deixou de ser o seu objectivo. Só dele tratará quando dele conseguir tirar algum proveito. Esta a realidade que ainda hoje está infelizmente vigente. Mude ela de báculo para cajado; de túnica luxuosa, para veste simples; de mitra dourada, para chapéu do dia-a-dia. E venha então, junto dos pobres, falar-lhes de pecado original, de inferno, de purgatório e sobretudo de céu, de FRATERNO AMOR. Urge que isso aconteça, pois está caindo em completo descrédito. - "Comunista..." gritará alguém. Não. Fui beber estes pensamentos aos pequenos livros do grande Redentorista, Bernard Haring: "À Contestação dos não Violentos", "À Igreja que eu Amo", ao "Tudo ou Nada", "É Possível Mudar," "Em Crente e Activa Liberdade", "Livres e Fiéis em Cristo", "Problemas actuais da Teoçlogia Contemporânea", "Que Padres para a Igreja" e algum mais, também de outros autores. Neles aprendi a ler o Evangelho de Jesus de uma nova maneira, não à letra, mas segundo o espírito dessa mesma letra e até a vê-lo vivo. Por isso eu me interrogo mais uma vez: "Porquê tudo isto?" - Porque ainda não nos convencemos que somos realmente todos irmãos, também o pobre Eduardo aquele que me roubou os meus dois chapéus e que passava os seus dias de criança de 11 anos, nu, metido numa bacia de água; aquele casal octogenário, cujo marido possuia um olhar de fogo, longínquo, a perder-se de vista, e a mulher uns olhos de grata ternura, olhares que jamais sairão dos meus; e aquele menino que me provocou com ferro e fogo, apenas dizendo "dá pão...dá pão..."
Já varios de vós me interrogastes porque volto ao Brasil com o nosso amigo Henri Le Boursicaud. Eis aqui a resposta: Vamos de férias à procura de mais uma razão para viver. - Agosto feliz também para todos vós e o meu abraço fraterno.