2010-12-08
Aventino Aventino - Porto
Meus caros AAAR:
"se podes olhar, vê; se podes ver, observa (Platão, República)
TER SIDO não é ter sido grande coisa. Um vaga-lume, uma ausência, um olhar furtivo de alguém que passou. TER SIDO não é ninguém, não eleva nem deprime, não constrói nem destrói. TER SIDO é como não ter existido: não tem estatuto, não tem medalha, não tem, não tem, não tem, não tem NADA.
TER SIDO é seres hoje, no teu escritório ou no teu lar, nos teus amigos ou na estrada, num caminho vazio ou no caminhar pleno de um breve silêncio. Teres sido Redentorista é seres REDENTORISTA hoje sem saberes sequer o que é ser redentorista. TER SIDO é seres como o nosso querido ASSIS tem sido: uma eternidade, um afecto, um dom ao encontro de uma humanidade.
Confesso-vos que não tenho deuses, nem heróis; nem estátuas, nem ilusões. E... pior que tudo..., nem sonhos nem esperanças. Àparte isso, carrego a alegria e o encanto dos dias, a felicidade e a ironia de que, afinal, sou mesmo feliz: felicidade triste, é certo, como nos disse o maravilhoso PESSOA ("triste de quem é feliz"), mas, mesmo assim, feliz. Rio-me, avanço, navego na alegria da minha própria estupidez. Se há algum homem a quem odeio é a mim mesmo; se há algum homem a quem, às vezes, prescruto, é também a mim mesmo. O seminário ensinou-me que não existo nem tenho vaidades; sou apenas um servo sem desejos nem satisfações. Tudo é um circo, maior ou menor e ali estou eu obrigado e condenado a bater palmas, efusivamente, ao fim de cada pantomina medíocre como se aquilo fosse o espectáculo MAIOR.
Vem isto a propósito de quem se rebaixa a ter sido, a ter raizes num reles português ou noutro português reles, num conde ou num visconde, numa alcova ou num aido, num vazio de filho de pai incógnito ou num vazio, também, de duques, marqueses ou outros aldrabões de igual jaez; num seminário ou num restolho largo da nossa planície comunista.
Vem isto a propósito do ter sido, de ter um passado, de ter sido apenas. E, sobretudo a quem não arrisca, não desventura, não quer DIZER:
Aqui rasgo o meu passado. Aqui me rasgo. De hoje em diante sou outro antónio, joaquim, francisco, josé, antónio, tiago, jorge, miguel, pedro, gustavo, manuel. De hoje em diante sou outro antónio, joaquim, francisco, josé, antónio, tiago, jorge, miguel, pedro, gustavo, manuel. De hoje em diante apenas sou, sou, sou, sou, sou, sou, sou, sou, sou, sou, sou. Tal qual sou; sem olhar atrás. Sem olhar, sequer.