2011-01-18
Alexandre Gonçalves - Palmela
O IMPERIALISMO DA IGREJA
Li o esforço clarificador do Arsénio. Um texto assim dá trabalho. Exige pesquisa e reflexão. É serviço, um bom serviço às causas que se defendem e em que se acredita. O Luís Guerreiro, com a autoridade que os anos, o estudo e a dedicação lhe conferem, explicitou luminosamente o cerne dos problemas levantados ao longo da já longa polémica. Ambos os autores referidos se exprimiram com elegância, simplicidade e respeito pelas diferenças. Não utilizaram adjectivos contundentes. Não fizeram ruído. Nem julgamentos apriorísticos. Num território deslizante, por onde têm flutuado as mais diversas correntes de opinião, manifestaram as suas convicções. Não nos são propriamente desconhecidas. De certo modo, são-nos familiares, com mais ou menos clareza. Foram muitos anos de catequese e de teologia de circunstância. Mais do que conceitos, eram imagens maternais, pacíficas. Irrepreensíveis. A Mãe Igreja é mãe, é incorrupta, é santa. Como a Virgem Maria. Cubra-se tudo com Fé, com mistério, com dogmas. Para que seja a VERDADE.
Mas vejamos o outro lado da Lua. A leitura atenta de toda a história da Igreja mostra-nos no mínimo uma entidade suspeita. Amiga dos poderosos, sentada no poder como autoridade feudal, esqueceu-se de Jesus Cristo e de Deus. Cercou-se de especialistas que inventaram uma engenharia minuciosa de natureza intelectual, para impor ao mundo a sua única verdade. Foi essa verdade que armou toda a Europa contra os infiéis. Por toda a parte se construíram castelos e muralhas, impondo uma civilização militarista e latifundiária, prometendo aos pobres o reino dos céus, em troca de sofrimento, penitências e submissão. Foi essa verdade que embarcou nos navios das descobertas, para lá longe arrasar outras culturas, outras religiões, em nome dum Deus europeu, feito em Roma, à semelhança de deuses arcaicos e pagãos. Onde ficou o Novo Testamento? Nos nossos dias, a memória colectiva está ainda muito fresca, não propriamente dos Livros Sagrados, que muito poucos lêem, mas de factos e doutrinas que mostram uma Igreja cheia de Deus mas vazia dos homens. Se Deus mora tão longe, ou se anda tão mal acompanhado, então para que serve a Fé? Se a Igreja é a única herdeira da Verdade Divina, então como se pode ainda ser cristão e filho de Deus?
Não escrevo nada disto para ofender valores ou crenças ou a FÉ seja de quem for. Prometo até não voltar a reflectir nestas páginas sobre o tema. Mais, defendo convictamente que toda a gente tem o direito e o dever de proteger-se das influências que se considerem nefastas. Nem que elas venham duma iluminação divina. Mas penso que já houve por diversas vezes excessos de linguagem, à míngua de conteúdos aproveitáveis. A Palmeira, nas diversas áreas por onde se tem expandido, adoptou um lema, simbolizado pelos verdes e pujantes ramos que a caracterizam. Ela é livre, é verde, é criadora. Respeitemos com elegância e bom humor estes adjectivos. E derramemos sobre eles o litúrgico vinho da amizade.