Com a descrição gulosa que o Vieira fez dos manjares em Orbacém é, de facto, de fazer inveja. A tarde escorria calma, como diria o Eça no conto d ‘ O Tesouro, mas enquanto neste conto a paisagem partilhava de um cenário lúgubre, na cabana do Assis partilhava-se a amizade à volta de umas papas, de castanhas assadas e, sobretudo de muitas falas e risos à mistura.
É sempre festa quando os amigos se juntam, mesmo quando para isso é preciso fazer tantos quilómetros. A força e a generosidade vêm do coração e só ele alimenta verdadeiramente. O repasto vale e vale muito, mas o que mais conta é a força que leva os amigos ao encontro uns dos outros.
Sinto-me contente por o Vieira ter partilhado esse encontro e por não perder esse e tantos encontros, à procura de amigos da Barrosa, deleitando-se com o gosto da memória e recriando uma vontade que não pode morrer, enquanto a saúde lho permitir. E oxalá que lho permita para poder continuar a ser uma força de solidariedade e de incentivo à amizade.
O dia de ontem estava escuro de núvens e ligeiramente frio. Em Cabanas as chaminés fumegavam e de longe a paisagem parecia natalícia, amaciada pela lenta nebelina entre montes.
Na "cabana" do Assis sentia-se o afago da lareira e lentamente o grupo se foi juntando.
O último foi o José de Castro que prometera saciar-nos com umas entradinhas de alheira e paio dos lados do Pinhão, primorosos em generosidade gustativa. Um vinho do Porto branco daquela vila duriense, com uma subtil casquinha de limão requintou um brinde à amizade.
O Castro ia justificando a proveniência dos enchidos enquanto deslizava a faca bem afiada em largas fatias que iam desaparecendo sobre pão fresquinho de mistura de milho.
Na cozinha aprimoravam-se os rojões com outras subtilezas de porco que iam acompanhar um arroz guloso de estrutura bem minhota.
Dispôs-se a mesa e a panelinha a fumegar empratou generosamente de arroz de sarrabulho bem escurinho e de carnes desfiadas, quentinho e de comer à colher.
Saboroso, com os cheiros pronunciados dos cominhos e o toque contrastante do limão a fraturar a substância das carnes porcinas, este arroz de sarrabulho enchia a alma, acolitado pelos rojõezinhos e tripinhas enfarinhadas, mais o bucho, o fígado e sangue cozinho bem passados no tacho, bem ao modo das gentes do vale do Lima.
À sobremesa a macieza de um leite creme sobre bolacha torrada com cobertura de canela e em uso no Minho nos dias de sarrabulho, seguiu religiosamente a receita tradicional. O que distingue este leite creme de outras receitas é a particularidade da bolacha que absorve lentamente a humidade do creme , a que se junta o polvilhar da canela como substituto do açucar queimado por ausência da ferramenta adequada, mas que completa bem.
O grupo era de 8 e tivemos a companhia do Padre Mário da Lixa, amigo do Assis e que foi uma presença muito agradável.
De tarde usamos a lareira do Assis para assar as castanhas com outras cozidas para satisfazer preferências, acompanhadas de uma jeropiga abafada pelo Meira na sua quinta que produziu também os vinhos servidos durante o lauto almoço. Completamos o lanche com as alheiras trazidas pelo Castro, que eram magníficas na sua consistência e sabores.
A tarde esteve sempre sombria mas na "cabana" do Assis o clima é sempre bom. Mas as tardes deste tempo também são curtas e a luz do dia foge sem contemplações. Tivemos que dar os abraços aos que ficaram e eu e o Meira rumamos aos destinos da partida matinal.
E destes Encontros e Reencontros se vai reforçando a AAAR, quase sempre a uma boa mesa que em tempos de inverno aquece o corpo e anima a alma.
O nosso colega Meira não é fã das novas tecnologias como instrumento de comunicação e até o telelé vive modestamente condicionado.
Mas é um entusiasta da convivência com os seus antigos colegas e daí ter sido o único nortenho a rumar há dias até à sagrada Palmela dos olivais estreitos.
Já hoje me ligou a marcar lugar na Quinta do Assis e partiremos juntos de Esposende, acompanhados do seu verde branco casta loureiro que tão bem produz na sua quinta para os lados de Braga.
É deste entusiasmo que os grupos se alimentam e se reforçam. Também o Assis já ontem colheu os fetos secos que lhe avizinham a casa e servirão para abafar o calor que coze as castanhas.
Claro que o seu recanto em Orbacém tem um encanto que deslumbra e envolve e se a nossa vida se completa pelas oportunidades que se aproveitam, um magustinho na montanha do Assis vale pelo gozo que transfere.
A Palmeira do Natal está em fase adiantada e vai reforçar a corrente que nos une.
O Assis convida-nos para um dia de S.Martinho no seu paraíso em Cabanas, Orbacém, no próximo dia 24, Sábado.
As castanhas estão bem boas e as subtilezas de porco completarão uma ementa quentinha e aromática.
Os interessados deverão informar o Assis da presença apenas para se escolher o tamanho das travessas de barro que vão à mesa bem cheirosas, para que o aconchego não falhe.
Uns rojõesinhos à moda do Minho e um arrozinho malandro de sarrabulho podem ser cartaz apelativo que completará a oferta.
Agora é só apontar na agenda e rumar bem ao norte...
Ah! as castanhas e a jeropiga de Palmela...dia se S. Martinho e eu sem provar aquelas deliciosas castanhas das terras frias do norte e centro do país, embebidas no doce nectar sadino. Voltarão a presentear-nos os generosos castanheiros da Beira e Trás-os-Montes com novos frutos e a doçura do sol voltará às vinhas da Estremadura, estou seguro. Novas chamas brilharão em nossos peitos e as palavras alexandrinas voltarão a dançar à volta da fogueira, mesmo que efémeras. Com elas, todos nós voltaremos a bailar como crianças da barrosa. Voltaremos a jogar à pelota e ao beto e correremos por uma bandeira de trapo. Mas felizes.
- Ontem, fui comer palha, palha de Abrantes. Qualquer um, em Abrantes, se baixa por palha. Que nos apelidem de burro, em momentos breves passados na cidade ribatejana, o prazer da palha sobrepassa de longe a maldade picaresca da palavra nela contida. Por palha desta... todos seremos capazes de chorar por mais.
Li que os comensais, no magusto de Palmela, foram 16 e do norte, os representantes, apenas os que no sul têm residência. Suponho. Na crise e talvez no tempo que se apresentava com má cara ponhamos a culpa. Nos 16 estávamos todos presentes e em sua voz a nossa voz na hora do canto.
Desde o norte aplaudimos a vossa iniciativa e às vossas castanhas queremos também nós juntar as nossas no próximo dia 24, em Cananas / Orbacém. É ainda Novembro mês de magustos, no dizer do Manuel Vieira. Portanto o nosso convite aqui fica para quantos/as desejem participar. Do norte ou do sul, do este ou do oeste. Haverá caldo e castanhas. Não faltarão os enchidos, mas também os vegetarianos/as puderão marcar seu lugar em nossa mesa.
Outros sabores e saberes desejamos às castanhas juntar. Porque não um momento cultural?...Vamos ainda pensar e, se possível, levaremos à prática.
Aguadamos por nomes de voluntários/as
Até breve
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