2013-01-01
Ismael Malhadas Vigário - Braga
Braga, 1 de janeiro de 2013
I
O sol tocou o teu rosto amaciado.
As aves descreveram círculos torneantes, calmos e estendidos.
A luz poisou calma sobre as ervas molhadas das chuvas anteriores.
Nos passeios passam promeneurs moles de uma noite longa e compassada.
As leituras destes dias fermentam a imaginação ardente, serena por fora
e há a poesia de Pessoa e de Walt Whitman, nestes dias de nuvens em viagem,
para dentro de mim.
Não há outro caminho para os dias que se estendem à minha frente.
E há a geração de vídeo-jogos imparáveis, da musculação e cultura do corpo,
sempre à volta de mim, do meu quarto donde me chega o mundo.
Todos os inícios são um sinal de transpor o caminho do desejo,
descer e subir a colina alongada do tempo.
Jano abriu as portas de par em par e entrou dentro da minha casa,
Sísifo exige o trabalho árduo por fora e dentro de mim,
elevar longe o peso dos dias que o tempo faz perdurar neste entardecer
dos dias maduros e saborosos de viver.
Ano do amor das famílias, da solidariedade, fazer amor, paz
às indústria de armas.
Ano de promenades à beira- rio, românticos:
com um cão de trela, falando às ervinhas,
lançar uma semente à terra, plantar árvores,
desejo o futuro, aqui à volta de mim.
II
Exposto sem estar apreensivo nestes dias que decorrem das tertúlias de café,
de políticas lorpas que engastam e indeferem esta vida boa de viver.
Deixemos o dia amanhecer, dia de luz e calor a amaciar estes jorros deslizantes,
este tempo de abraços e não tanto disputa de ideias;
Este homem é antigo e a solução está à frente do olhar e do ouvido.
Quem tem ouvidos que oiça.
Há palavras cansadas dentro de mim que não são as palavras escolhidas neste dia
que se quer de amanhecer.
Há um novo desejo em todos os dias que me levanto,
e pensar que o dia que vem é melhor que o dia que já passou,
águas que passais por mim, sem poder segurar-vos todas
cá dentro.
O sabor desta água inebria e ilumina e abre
a esperança de um novo caminho dos que já foram lavrados,
por pedras e escolhos donde me soube separar.
III
Os automóveis desconchavados passam de novo a estrada,
gasolina tão estragada no preço a ajudar alguém,
arranha-céus nas américas ou nas arábias, novos jardins suspensos da Babilónia.
E esta mania monótona de gastar dinheiro: andar de automóvel
para todo o lado e para lado nenhum.
Caminhos de hoje já não são os caminhos de ontem e, se não bastasse,
mudam-se à força de os transformar,
e mudam-nos cá por dentro, a nós, à força de os repetir.
IV
Andar à beira rio e de mão co’ amada,
assistir ao dealbar lento de ervas a crescer, flores inverniças, dolentes e adormecidas,
e a visão da mulher acabada de se extasiar, a tocar a fresca brisa,
Coração de manhã a acordar em braços duma esperança,
feita duma outra ternura,
e não este país a definhar de contente,
por teimar em não querer ser diferente.