2015-03-18
manuel vieira - esposende
O nosso Peinado pressentia, por razões várias, que não iria ter vida longa e melhor seria viver intensamente o que lhe restava para consentir aquele destino. Era um amigo bom e sincero e numa das últimas conversas inquiria-me sobre as opiniões diferentes que podemos ter sem interferir na amizade franca.
Ao lado da sua cama falámos cerca de uma hora, intervalando com bátegas de sono lento. Despertava-o com um toque na sua mão e pedia-me desculpa. Perguntava-me sobre a lampreia e dava-lhe estímulo à conversa lembrando-lhe que tinha de arribar para experimentarmos umas amostras culinárias com tradição no Alto Minho. A conversa mexia com ele e despertava-o e o tema cumpria o seu fim.
Falei-lhe do seu neto Pedro Jr e das suas mensagens no Fale Connosco . Ele falou-me de afetos com um sorriso largo.
Também o José de Castro na visita que lhe fez lhe leu os escritos do Pedro Jr., o hino do clube do seu coração, as palavras de incentivo e coragem na doença.
Apetece-me falar dos seus últimos dias, talvez por serem uma mostra da onda de preocupação e solidariedade que ele sentiu enquanto esteve consciente. Mas estaria aqui a escrever sobre esperança ou a perda dela em momentos tantos.
Ultimamente nos Cuidados Intensivos o Diamantino conseguiu estar com ele e desprender num abraço as angústias acumuladas de tanto silêncio e ouvir baixinho um repetido “obrigado”.
Nas conversas quase diárias que tinha com o Diamantino percebi bem quanto este nosso colega sofreu, pelas correrias para o Hospital de Santo António, pelas chamadas para a esposa do Peinado para saber mais notícias, pela difusão sobre o estado clínico pelos colegas, pela amargura das notícias mais duras, pelos silêncios nas nossas conversas a pensar no pior.
Quando me disse que tinha de conseguir entrar nos Cuidados Intensivos para o ver disse-lhe, “vai por nós Diamantino”.
E é ao Diamantino que eu quero agradecer, que todos devemos agradecer, pela sua persistência e dedicação, pelo cumprimento da missão que traçou para si junto do amigo comum a quem dedicou tanto tempo. A amizade é assim e por vezes tem esta dureza.
Em dias muito bons o Diamantino ligava-me e perguntava: sabes quem tenho aqui ao meu lado? Eu respondia-lhe sem dúvidas: “o Peinado”. Estavam na cidade tripeira e em minutos conversávamos os três.
Foi assim que eu soube do internamento do Peinado quando o Diamantino, a seu lado, me ligou e disse que estavam a saborear umas moelinhas no 8º andar. Só depois me disse que estavam no 8º piso do Hospital de Santo António sem prever tão triste fim.
Falar, falar do Peinado alivia-me o espírito … e estaria aqui muito tempo a lembrar tempos.
Uma palavra especial para o Delfim pelas emoções que traçou no seu escrito e um abraço sincero de força.
O António Peinado juntou-nos ontem pertinho do seu estádio, lembrou-nos como a vida tem de ser vivida e por vezes repensada, juntou-nos à sua volta, levou-nos a tomar um cafezinho no “Velasquez” dos outros seus amigos diários e partiu na paz dos deuses …